Com quase 25 mil computadores, fábrica processa os problemas matemáticos que criam os bitcoins
Por
Cao Li, do New York Times News Service
access_time
25 set 2017, 14h10
Fábrica de Bitcoin: a Bitmain
consegue energia elétrica mais barata para seus computadores diretamente
do governo chinês (Giulia Marchi/The New York Times)
Dalad Banner, China – Eles trabalham em
fábricas, no negócio de carvão e como fazendeiros. Todos se encheram de
esperança quando o boom do carvão prometeu trazer indústrias e empregos
para essa terra de planícies gramadas da Mongólia Interior. Quando o
boom não veio, foram procurar trabalho em todos os lugares.
Hoje, vários encontraram vagas em empresas que fazem dinheiro – do tipo digital.
Aqui, no que é chamada pelos locais de Zona de
Desenvolvimento Econômico de Dalad, fica uma das maiores fazendas de
bitcoins do mundo. Os oito prédios com telhados de metal azul
representam quase um vigésimo da produção diária mundial de
criptomoedas.
Baseado no preço de hoje, a empresa emite US$ 318.000 em moeda digital todos os dias.
Do lado de fora, a fábrica – de propriedade de uma companhia
chamada Bitmain China – não parece muito diferente dos outros prédios
do parque industrial.
Entre seus vizinhos estão indústrias de substâncias químicas
e fundições de alumínio. Alguns dos prédios da região nunca foram
terminados. Em geral, as estradas são silenciosas, a não ser por um ou
outro caminhão carregando carvão.
No interior da Bitmain, em vez de máquinas industriais
pesadas, os trabalhadores lidam com fileiras e fileiras de computadores –
quase 25 mil no total – processando os problemas matemáticos que criam
bitcoins.
Os trabalhadores carregam laptops enquanto andam pelos
corredores procurando falhas e checando as conexões dos cabos. Eles
completam os tanques de água que impedem os computadores de derreter ou
pegar fogo. Em volta deles, centenas de milhares de ventiladores enchem o
prédio com um tipo de ruído branco.
Quem acredita nos bitcoins diz que será a .
Puramente eletrônica, pode ser mandada através das fronteiras
anonimamente sem a supervisão de uma autoridade central. Isso a torna
atraente para um grupo variado, e algumas vezes incompatível, de pessoas
que inclui entusiastas da tecnologia, aqueles que lutam pelas
liberdades civis, hackers e criminosos.O
bitcoin também é, em geral, produzido na China. O país faz mais de dois
terços de todos os bitcoins emitidos por dia. A Bitmain, fundada pelo
antigo analista de investimentos Jihan Wu, ganha dinheiro principalmente
vendendo equipamentos para fazer bitcoins, assim como minerando a moeda
em si.
A China, no entanto, tem sentimentos contraditórios em relação ao bitcoin.
Por um lado, o governo se preocupa com o fato de que o
bitcoin permite que os chineses ignorem os limites rígidos sobre quanto
dinheiro podem mandar para o exterior e também que possa ser usado para
cometer crimes. Por isso, as autoridades chinesas estão tentando fechar
as bolsas de bitcoin, onde a moeda é comprada e vendida. Apesar de não
afetar a fabricação de bitcoin diretamente, isso poderia tornar mais
cara a compra e a venda da moeda digital em um de seus mais importantes
mercados, prejudicando o preço.
Por outro lado, a moeda digital pode representar uma
oportunidade para a China impulsionar sua indústria de novas
tecnologias, uma motivação por trás de seu extenso incentivo a outras
áreas de ponta, como carros sem condutor e inteligência artificial. O
país continua a oferecer a produtores de bitcoins, como a Bitmain,
eletricidade barata – já que fazer a moeda digital exige uma quantidade
imensa de energia elétrica – e outros subsídios.
Dalad Banner pode estar longe da cena de startups de
internet de Pequim e do centro de produção de dispositivos eletrônicos
do sul do país. Ainda assim, vários trabalhadores e moradores da região
veem uma oportunidade digital para Dalad Banner e para o resto de sua
parte da Mongólia Interior, uma área famosa na China por fábricas
construídas pela metade e cidades tão vazias que às vezes são chamadas
de fantasmas.
“Agora, a mina tem cerca de 50 funcionários”, afirma Wang
Wei, gerente da Bitmain China de Dalad Banner, usando uma das várias
metáforas para o trabalho feito aqui. “Acho que, no futuro, poderá ser
responsável por centenas ou mesmo milhares de empregos, como as grandes
fábricas.”
Morador da região, Wang, de 36 anos, que foi vendedor de
carvão, comprou um bitcoin cerca de seis meses atrás. Desde então, o
preço mais do que dobrou de valor. “Ganhei muito dinheiro”, garante.
A China também vê uma nova fonte de empregos em potencial,
principalmente em lugares pouco desenvolvidos como Dalad Banner. O
condado de 370 mil pessoas na beira do grande Deserto Kubuqi possui
reservas de carvão e indústrias pesadas que dependem dele, como o aço.
Mas está atrás de grande parte do país no desenvolvimento geral da
economia. Faz parte da área urbana de Ordos, cidade a cerca de 560
quilômetros de distância de Pequim, famosa por seus prédios vazios.
Dalad Banner não é o tipo de lugar que à primeira vista
parece feito para o trabalho com alta tecnologia. Na verdade, levou
algum tempo para que os habitantes da região se acostumassem com a
ideia, mesmo entre os trabalhadores.
“Não sabia nada sobre bitcoin antes”, conta Li Shuangsheng, morador de 28 anos que cuida das operações de uma das oito fábricas.
Ele saltou de emprego em emprego – a fábrica de produtos
químicos era muito barulhenta e poluída, conta – antes de chegar
recentemente à fábrica Bitmain China de Dalad Banner, uma das poucas
oportunidades de emprego lucrativas nesta região pouco povoada.
Li ainda não possui um bitcoin, mas está feliz com o
trabalho e vem estudando o assunto on-line quando o tempo que passa com a
família permite.
“Agora estou começando a ter alguma ideia”, garante.
Muitos na fábrica já passaram pelos altos e baixos da economia local.
Bai Xiaotu foi demitido de uma fábrica de móveis estatal em
1997. Ele vinha trabalhando em vários tipos de empregos menores até que,
em dezembro, conseguiu uma vaga como faxineiro na fazenda Bitmain de
Dalad Banner.
“Olhe ao redor, existem fábricas abandonadas dos dois lados
da nossa fazenda. Muitas empresas ainda não estão muito bem”, afirma
Bai, de 53 anos, com o rosto fustigado pelo tempo.
Mas essa indústria ainda é nova para a maioria. Bai Dong, de
31 anos, filho de Bai Xiaotu, nunca havia ouvido falar de bitcoin
quando seu pai conseguiu o emprego. Depois de pesquisar na internet,
descobriu que o preço do bitcoin estava subindo depressa, e que a
fazenda era uma das maiores do mundo. “Minha sensação a respeito do
futuro da indústria é positiva”, diz ele.
Mas continua confuso a respeito do que é a mineração de bitcoin.
“Temos minas de carvão. E agora temos minas de bitcoin. São minas, mas qual é a relação entre elas?”, questiona.
Cao Li | © 2017 New York Times News Service