Mesmo depois de o Bitcoin ter perdido os US$ 30 mil nesta semana e de ter caído mais de 29% em pouco mais de um mês após declarações feitas por Elon Musk, CEO da Tesla, e pela maior repressão à mineração na China, investidores mostraram que seguem confiantes e viram o abalo como oportunidade.
O número de cotistas que aplicam em fundos, com gestão ativa ou passiva, tem aumentado, em meio à avaliação de oportunidade, com um bom “ponto de entrada” e pela própria demanda por aumentar a diversificação da carteira.
É o que mostra um levantamento feito pelo InfoMoney com dados da Economatica. Na análise, os nove maiores fundos brasileiros que aplicam em criptoativos – em termos de patrimônio líquido – registraram um aumento de 11% no número de cotistas entre o fim de abril e 17 de junho deste ano, ao mesmo tempo, em que o preço em dólar do Bitcoin caiu 34%, segundo dados da CoinMarketCap. Se há dois meses, o número total de cotistas era de quase 146 mil, agora já ultrapassa os 161 mil.
A pesquisa levou em consideração fundos que aplicam em criptoativos e que podem investir 100% ou apenas 20% em criptomoedas, respeitada a regulação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para produtos voltados a investidores qualificados (com pelo menos R$ 1 milhão em aplicações financeiras) ou de varejo. Só foram considerados fundos que possuíam mais de mil cotistas até abril deste ano.
Na lista estão produtos de gestoras como Hashdex, Vitreo, BTG Pactual e BLP Asset. Na avaliação de Axel Blikstad, sócio da BLP Asset, que administra hoje R$ 644 milhões e tem três fundos de criptoativos de gestão ativa, a maior procura está partindo principalmente de investidores profissionais – que são o carro-chefe de um dos fundos da gestora.
A visão é compartilhada por Roberta Antunes, chefe de expansão na Hashdex, gestora que possui mais de R$ 4 bilhões de ativos sob gestão e cinco fundos de gestão passiva que aplicam em criptomoedas. Segundo ela, em abril, os fundos tinham cerca de 94 mil cotistas e hoje estão com 101 mil cotistas.
“Enxergamos um movimento mesclado de pessoas que não entraram antes porque o Bitcoin estava mais caro e de pessoas que já estavam e decidiram aumentar a posição nos criptoativos”, aponta.
A força do ETF
Roberta conta ainda que o aumento de cotistas dos fundos poderia ter sido maior, não fosse a migração que ocorreu para o fundo de índice que a casa passou a oferecer neste ano, negociado sob o código “HASH11“.
Segundo dados atualizados da própria Hashdex, o primeiro ETF de criptoativos viu o número de investidores dobrar em menos de dois meses, ao passar de pouco mais de 61 mil cotistas no fim de abril, para 122 mil, em 20 de junho deste ano.
Outro dado que tem chamado a atenção é que cada vez mais investidores podem estar de olho no HASH11 como opção de diversificação em renda variável fora do país.
De acordo com informações da B3, em maio, o ETF da Hashdex já era o segundo em número de investidores na Bolsa entre todos os ETFs disponíveis localmente. Ele fica atrás apenas do produto que replica o S&P 500 (IVVB11), um dos principais índices da bolsa americana, com cerca de 150 mil cotistas.
O ETF segue o Nasdaq Crypto Index (NCI), que foi desenvolvido em parceria com a Nasdaq e possui hoje oito criptoativos em seu portfólio. Segundo rebalanceamento feito em maio, 67% da carteira estão em Bitcoin e o segundo maior percentual (28%) está alocado em Ethereum.
Na comparação com os pesos da carteira anterior, o Bitcoin perdeu espaço. Até abril, a criptomoeda mais famosa do mundo representava cerca de 79% do índice. Já o Ethereum viu a sua participação aumentar, ao passar de cerca de 17% para 27% com o rebalanceamento. Também houve a inclusão de duas criptomoedas: Uniswap (UNI) e o Filecoin (FIL), que representam os segmentos de finanças mais descentralizadas e armazenamento.
Para a especialista da Hashdex, a chegada do HASH11 ajudou a impulsionar a entrada de investidores institucionais, ainda que os de varejo sejam maioria. E esse interesse pode fazer com que o mercado cresça ainda mais, já que mostra a importância que certas empresas estão dando ao ecossistema de criptoativos.
Aprova disso é que o mercado ganhou mais um ETF na última quarta-feira (23). Negociado sob o código “QBTC11″, o fundo tem 100% de exposição a Bitcoin e é o primeiro do tipo na América Latina.
Ele tem como foco replicar o índice CME CF Bitcoin Reference Rate, referência dos contratos futuros de Bitcoin negociados pela bolsa americana Chicago Mercantile Exchange Group.
Incertezas no radar
Mesmo com o crescimento de opções de investimento e da demanda por criptomoedas, Blikstad, da BLP Asset, não esconde que o curto prazo deve ser marcado ainda por fortes incertezas.
A autoridade monetária chinesa balançou o mercado nos últimos dias, ao dizer que convocou representantes de grandes bancos e outros players no mercado de crédito para reiterar a proibição dos serviços de criptomoedas.
“Atitudes como essa da China causam barulho, porque o poder computacional de mineração diminui até que essas máquinas sejam levadas para outros países. Então, por enquanto, a insegurança ainda é alta, o que afeta o preço do ativo”, pontua Blikstad.
Além de questões relacionadas à China, Roberta destaca a assimetria de informação. Segundo ela, ainda é muito difícil para diversos participantes do mercado equilibrarem a atenção dada ao noticiário, em meio a um mercado muito novo.
“Há dificuldade de entender qual é o fato, e acaba virando uma coisa gigante, que pode proporcionar movimentos de compra e venda no impulso”, destaca a especialista.
Maior otimismo no médio e no longo prazo
Ainda que o cenário seja mais conturbado no curto prazo, as apostas das gestoras são mais otimistas no médio e no longo prazo. Na avaliação de Roberta, a expectativa é que o preço volte a se equalizar em breve.
Segundo ela, há uma institucionalização cada vez maior dos produtos e há mais empresas que estão criando startups que investem em criptomoedas. Além disso, existe um movimento de companhias que optaram por guardar recursos em forma de Bitcoin, ou seja, ter o criptoativo em caixa, o que, na sua visão, ajudaria a trazer uma maior profissionalização ao mercado.
Blickstad também aguarda a entrada de mais investidores institucionais, que não costumam atuar alavancados, o que ajuda a deixar o mercado mais “limpo”, sem grandes movimentos especulativos. “Até abril, tínhamos muito investidor de varejo asiático bastante alavancado. Com sua saída, podemos ficar com um mercado nas mãos de instituições mais fortes”, avalia o gestor.
Para ajudar nesse sentido, um dos pontos mais aguardados pelo mercado é a aprovação de um ETF pela SEC, a CVM americana. Hoje, há nove pedidos à espera de uma decisão do órgão.
“Agora, todos os bancos estão envolvidos. Teve a listagem da Coinbase [exchange americana] na Nasdaq em abril e já tem dois ETFs do tipo no Canadá. Acredito que os EUA não devem querer ficar para trás. Isso pode ser um trigger [gatilho] forte”, destaca o especialista.
De olho no portfólio
Quem deseja se arriscar pelo mundo dos criptoativos, precisa analisar bem os produtos que estão disponíveis no mercado. Segundo o planejador financeiro CFP José Faria Júnior, duas opções para quem busca maior facilidade e segurança contra roubos e perda de chaves é investir via fundos e ETFs.
No caso dos fundos, Faria Júnior diz que o investidor precisa olhar com atenção as taxas de administração e de performance. “É preciso entender se a taxa de performance realmente não está pegando boa parte da rentabilidade do fundo, além de fazer uma análise da taxa de administração, ver quem é o gestor e sua experiência no mercado.”
Mesmo que seja um universo bastante novo, há alguns gestores que estão se especializando e que acompanham mais o mercado, caso dos fundos analisados na pesquisa.
Outro ponto importante está ligado à exposição, já que fundos voltados apenas para investidores de varejo só podem aplicar até 20% da carteira em criptomoedas, por causa de questões regulatórias. Com isso, o investidor fica menos exposto do que se aplicasse diretamente em criptoativos ou se optasse por investir em um ETF que seguisse um índice de criptomoedas.
Faria Júnior ressalta que, com os ETFs disponíveis na indústria brasileira, os fundos foram penalizados em termos de custos, por contarem com a incidência de come-cotas (uma espécie de antecipação de imposto que é feita nos meses de maio e novembro), e por prazos de resgate maiores.
Além disso, o percentual de imposto cobrado nos fundos é superior ao dos ETFs. Enquanto a tributação nos primeiros produtos segue a tabela regressiva do IR, com alíquotas que variam de 22,5% a 15% a depender do prazo de resgate, a alíquota para ganhos com os ETFs de cripto é de 15% sobre as operações comuns e 20% sobre as de day trade, ou seja, aquelas em que a compra e a venda ocorrem no mesmo dia.
Para o planejador financeiro, a montagem de uma carteira de investimentos com aplicações em criptomoedas deve ser vista com cuidado e focada em uma gestão mais ativa para diminuir os riscos. Segundo o especialista, o investidor deve aplicar apenas entre 1% e 5% do patrimônio em criptoativos.
“Se o investidor optar pela compra nesse período de baixa, pode manter a posição até que o preço do ativo suba e atinja o percentual máximo de alocação da carteira, que deve ser de 5%. Da mesma forma, se cair, ele pode aumentar a posição, mas sempre obedecendo esse limite de 5%”, pontua o planejador.
Fonte: https://www.infomoney.com.br/